Também fui um dos milhões de portugueses que se mantiveram frente ao ecran a dissecar os prós e contras relativamente ao referendo do próximo dia 11 de Fevereiro.
Tratou-se uma vez mais de um programa inconclusivo e, pior ainda, sem conseguir esclarecer as verdadeiras vítimas desta realidade - mulheres de fracas posses, maioritariamente de estratos culturais mais baixos, já deitadas porque amanhã têm que ir trabalhar e levar os filhos para a luta do dia, e, portanto, sem acesso a esta informação - nem mesmo todos aqueles que seriamente querem saber decidir.
Independentemente desta temática ser, a meu ver, fisiologicamente um problema essencialmente feminino embora psicologicamente seja partilhado por mulher e homem, as meninas como a da foto em nada ajudam à diminuição das estatísticas que dão força à sua proliferação.
O nosso blog abre a partir de hoje esta tribuna à discussão do tema para que cada vez seja mais criterios o juízo a que somos convidados a proferir daqui a uns dias.
Querem aproveitar ?
6 Comments:
Mas que raio de sarilho o nosso amigo António Matos nos vai arranjar!! É um tema tão apaixonado que ,por mais respeito e cuidado com as opiniões dos que discordam de nós, pode sempre provocar algumas "carambolas".Por outro lado, se está aberto o tema, a minha consciência impede-me de ficar calado.Eu sou um convicto votante do "não". Razão fundamental e acima de qualquer outra- Se há um coração a bater às 10 semanas, então já estamos perante uma vida. Entre os inúmeros textos que li sobre a matéria envio-vos excertos de uma crónica que pela sua moderação, respeito pelas opiniões contrárias e clareza nas razões da minha decisão me parece adequado:" Na questão do aborto voluntário verifica-se a contraposição entre dois valores básicos e fundamentais: o direito à liberdade da mãe e o direito à vida do embrião. Aliás, os próprios movimentos que se opõem manifestam isto mesmo, ao denominarem-se respectivamente "pela escolha" e "pela vida". Assim, a resposta à pergunta do referendo apresenta-se de forma cortante. Quem acha que a liberdade da mulher para determinar a sua vida e o seu corpo é essencial deve votar "sim". Quem pensa que o direito à vida do embrião é dominante deve votar "não"...
Isto é que torna a questão tão angustiante. A sua dificuldade vem precisamente deste custo: secundarizar e diminuir algo de vital ao proclamar um aspecto também vital.
Ter consciência deste custo ajuda, não só a ver a importância da questão, mas também a entender e, talvez, a respeitar os adversários. Eles lutam por um valor que não podemos deixar de reconhecer. Percebe-se também que, dada a dificuldade do dilema, tanta gente procure escamotear a questão levando-a para campos acessórios. Mas a verdade irredutível é que o problema mantém sempre toda a sua dolorosa acuidade: dois direitos básicos opõem-se quando uma mulher contempla abortar o filho que gerou...
Mas, como vimos, o peso de cada um desses valores mede-se no confronto com o outro. Essa é a gritante dificuldade. Quem vota "sim" tem de estar preparado para levar a sua defesa da liberdade da mulher a ponto de se sobrepor à vida do filho em gestação. Deve votar "não" quem acha que a vida do embrião tem um valor tão grande que chega para sacrificar a liberdade da sua mãe em definir o seu futuro num momento tão doloroso. Um "sim" está pronto a destruir uma vida e um "não" prepara-se para restringir uma liberdade pessoal fundamental. Este é o profundo dramatismo do dilema. Não há volta a dar-lhe: é preciso escolher uma resposta e ela, qualquer que seja, tem sempre implicações terríveis...
Este é o dilema elementar do referendo. Mas existe um detalhe que rompe o paralelismo: os dois lados não se colocam igualmente perante estes termos. Os defensores do "não" assumem o sofrimento das mães, criando muitas instituições para o aliviar, enquanto os do "sim" costumam escamotear a vida do embrião. Isto só por si revela um facto indesmentível: postos francamente em confronto, o valor da vida sobrepõe-se naturalmente ao da liberdade. Sem liberdade a vida resiste, mas sem vida não há nada. Essa é a razão por que em todas as civilizações da História o aborto provocado foi em geral sempre repudiado."
Um abraço a todos,
José Luís Fonseca
Excelente iniciativa, caro amigo Matos!
Ainda para mais, porque temos cá pela casa clínicos que, pela sua experiência, poder-nos-ão dar uma achegas interessantes sobre esta matéria.
Logo mais à noite já cá virei dar a minha opinião sobre o assunto (agora vou jogar uma futebolada, para ver se me apresento mais competitivo em próximas corridas do IHSV), mas para já apenas queria expressar a minha opinião de que o (longo) debate de ontem, com um ambiente de claque, palminhas e gritinhos (de parte a parte, entenda-se...), foi, a meu ver, deveras inconclusivo e sobretudo pouco esclarecedor.
Logo de início teciam-se loas a uma certa elevação e serenidade, sem hipocrisia nem demagogias serôdias, mas poucos minutos após já se estava a cair num profundo desvirtuamento do que se estava a discutir (de parte a parte, entenda-se...), com histeria a rodos e demasiadas tergiversações sobre assuntos que iludem um pouco, a meu ver, a questão principal.
Irei votar `SIM´(tal como já fiz há 9 anos...), mas ontem o lugar que se calhar me estaria reservado, era mesmo sentar-me nas escadarias centrais de acesso a ambos os lados da `barricada´.
Toda e qualquer intervenção cívica no sentido do SIM ou do NÃO relativamente ao aborto tem em mim uma complacência total se não vier eivada de facciosismo, de partidarite, de detentora da verdade absoluta enfim, se vier para esclarecer o seu ponto de vista.
A mim caber-me-à a livre capacidade de escolha perante a qual exijo o respeito que os valores democráticos impõem.
A 11 dias da data do referendo confesso, a enorme perplexidade que me vai no espírito.
Reconheço virtualidades numa e noutra posição mas também me interrogo pela boa vontade de ambas.
Tenho para mim que este referendo ( consubstanciado na frase que lhe dá andamento ) é enganador nos seus objectivos.
Creio sinceramente que o país dito profundo vai referendar uma questão a pensar noutra !
Creio que o país dito profundo tem noções absolutamente distorcidas dos conceitos de despenalização e de descriminalização.
Creio sinceramente que o referendo inside essencialmente numa questão jurídica e não na questão de consciência.
E isso meus caros leitores, não credibiliza o referendo em si mesmo nem a classe política que se mostra educadora mas que pouco faz para elucidar a sério sobre o assunto.
A comunicação social ( claro que a comunicação social tem que ser chamada à colação !!! ) não interpreta convenientemente o sentido da coisa ao lançar num programa do tipo Prós e Contras esta discussão ! Porquê ? Porque o factor mediatismo leva a que um assunto desta seriedade seja dirimido em directo à base de vaias duma assistência que está lá apenas para fazer número !
O factor charneira onde reside um dos pomos da discórdia tem a ver com o período de 10 semanas durante as quais se discute o conceito a dar ao que está na barriga da mulher : é uma coisa ? é um embrião ? é um feto ? é um bébé ? é uma vida ?
De acordo com os interesses a defender ( não os interesses da mulher ! os interesses dos homens e das mulheres que não estão a viver um caso de aborto )assim se define o produto da junção do espermatozóide com o óvulo.
A partir do momento em que um casal que trabalha para ter um filho e teve a sua hora de deleite sexual, começa a esperar um sinal que permita à mulher dizer "estou grávida!" ela diz que está grávida de uma coisa ou dum bébé ?
É-me perfeitamente irrelevante um período de 1,2 10 ou 20 semanas para filosoficamente se considerar o antes e o depois e daí legislar !
Mas o facto de o SIM ganhar e dar lugar a legislar em conformidade, levanta problemas de inconstitucionalidade como explicou Vital Moreira o que me desorienta em termos do que se pretende !
Mas a verdade é que o NÃO ao pretender defender a vida , não consegue convencer-me da excepção que põe ao bébé concebido fruto de uma violação !
Há vida boa e vida não boa ? Há vida a preservar e vida a abater ?
Por aqui me fico pronto a beber todas as opiniões que me ajudem a decidir . O blog é tão bom sítio como qualquer outro e nós que não vamos à televisão, temos o direito e a obrigação de nos informarmos.
Por aqui passam mulheres, homens, juristas, médicos, jovens, menos jovens, então porque não TODOS dizerem de sua justiça ?
Eu agradeço !
Como prometido, aqui venho dar a minha perspectiva pessoal sobre esta questão.
O referendo à IVG, tal como se havia passado, aliás, em 1998, é uma matéria que está a causar profundas clivagens e diferenças (que não fracturas, penso) de opinião na sociedade portuguesa.
Por paradoxal que possa parecer, acho que isso é extremamente positivo.
E acho-o, fundamentalmente porque num país que vive enleado no (e do...) futebol e noutras questões nada relevantes e estruturais, num país que se enleva na doce madorna e brandos costumes que nos caracterizam, num país atavicamente resistente e avesso, em múltiplas questões, à mudança, é importante e oportuno que surjam matérias propícias à discussão e confronto de opinião (por um lado), e intervenção cívica (pelo outro).
Posto isto, como já referi, tenho `ab initio´ que verberar fortemente os anátemas que se estabelecem de cada um dos lados de opinião (do estilo, "nós, os "bons"; eles, os "maus").
Como é óbvio, creio que desde que o bom-senso não nos tolde o discernimento, haverá bastos motivos para, nesta matéria em concreto, em cada um dos `lados´, encontrarmos pontos comuns aos nossos próprios valores.
Por isso mesmo, acho atendível que muitas pessoas se sintam divididas (se bem que me pareça que, em múltiplos casos, essa "divisão" traduza essencialmente alguma desinformação) e não estejam seguras de qual deverá ser o sentido de voto no dia 11/02.
Talvez embuído de alguma "deformação profissional" (perdõem-me lá!...), julgo que, em 1ª instância, o que está aqui em causa é efectivamente desde logo uma questão jurídica, no âmbito do direito penal, tendente a despenalizar, até às 10 semanas de gestação do feto, a mulher que incorra numa IVG.
A consciência colectiva do país, mesmo para a esmagadora dos simpatizantes do `NÂO´, creio que aponta já nesse sentido, no sentido de não penalizar criminalmente a mulher que faça uma IVG (peço perdão, mas não gosto da palavra aborto - que têm uma carga demasiado seca e negativa a meu ver -, pelo que prefiro utilizar IVG), desde que num período inicial da sua gravidez.
As mulheres são hoje, em muitos dos sectores da nossa vida em sociedade, demasiado importantes (fundamentais, até), para que devam ser submetidas a um crivo judicial (feito por homens e mulheres, também eles com as suas crenças e convicções, logo subjectivo e falível) numa matéria desde género.
E desde logo, deva-se acrescentar, quando a tutela penal as abarca só a elas, olividando a responsabilidade do progenitor masculino nestas situações de IVG (que desconfio, na esmagadora maioria das situações, advir de fortes pressões do homem para o efeito ou, no mínimo, com o seu beneplácito mais ou menos tácito).
Nesta matéria, em termos de igualdade de direitos, creio haver ainda um longo caminho a percorrer.
Posto isto, o que me parece preocupante é que, com a actual moldura juridico-penal (que o `NÂO´ defende que se mantenha), em sede de prevenção da IVG, os efeitos estão longe de estar prosseguidos, sendo que o número de mulheres portuguesas que praticam a IVG é assustador (os números trazidos a terreiro, de forma nua e crua, por Constantino Sakallarides, mostram a dimensão deste fenómeno do qual, pela sua amplitude, creio que não nos devemos alhear).
Ora, manter o actal enquadramento jurídico é, de uma forma muito pragmática, manter o actual estabilishment, é, se quisermos, que este "flagelo" permaneça e continue, pois nada há que nos indique (bem pelo contrário), que possa haver uma regressão massiva no recurso à IVG.
Estamos em pleno Sec. XXI e não devemos, na questão em apreço, assobiar para o ar ou enterrar a cabeça na areia, fingindo (não será este país uma exponenciação colectiva do "faz de conta"?) que o problema não existe ou que tem contornos residuais.
O problema existe e, sobretudo, verifica-se ao nível das camadas mais desfavorecidas e menos informadas da população.
E essa questão da informação, é tão ou mais importante quanto o facto de sabermos que em matéria da IVG (como em múltiplas outras) os mecanismos de prevenção (educação sexual, o recurso ao planeamento familiar), ainda são olhadas com desconfiança e de soslaio por largas faixas da sociedade portuguesa.
Creio que as consultas de planeamento familar estão disseminadas por todo o território (por excelentes clínicos, sublinhe-se), mas é ainda quase que residual o número de portugueses(as) que a elas se socorrem, numa prática que, aliás, é recorrente e normalíssima em todos os países da europa ocidental.
Este nosso endémico atraso, acarreta depois este tipo de problemas, com as gravidezes não desejadas e o recurso aos famigerados "desmanchos" (uma palavra crua e demasiado arrepiante mas que se aplica bastas vezes, sobretudo nas áreas mais rurais, para caracterizar a IVG).
O problema existe, não nos iludamos, e continuará a verificar-se se não se procederem a alterações de fundo, não só no plano legal mas sobretudo no capítulo da prevenção, que deve começar a ser realizada nas escolas.
Tenho alguma dificuldade em colocar-me na pele de uma mulher que decide abortar mas, daquilo que conheço do universo feminino (se é que alguma vez nós homens chegamos a compreender verdadeiramente o universo feminino, claro...), parece-me resultar claro que essa decisão só se verifica quando nenhuma outra lhe pode prevalecer.
Não vejo, sinceramente, como é que uma mulher abdica de uma parte de si, quando se pode socorrer de uma alternativa bem mais positiva e humana que priviligie, em suma, o nascimento do feto que trás dentro do seu embrião.
Para tomar essa decisão, tem que ser uma decisão que apenas acontece quando falharam todas as outras, quando a única alternativa é essa.
E nestes casos, caros amigos, nós sabemos como as mulheres, estando deteminadas e obstinadas num assunto, são resolutas e deteminadas em ir até ao fim.
Para o mal ou para o bem, é a condição feminina e, caso a decisão seja de proceder a uma IVG, a mulher fá-lo mesmo.
E aí, meus caros, acho as mulheres demasiado fundamentais para que me sinta no direito, independentemente dos meus valores, de as sujeitar a socorrerem-se ao aborto clandestino, as sujeitar a mazelas físicas para o resto da vida, de as sujeitar, até, a porventura perderem uma das suas mais belas essências que é exactamente serem `fonte de vida´.
A IVG existe, continuará a existir seguramente, mas prefiro sem sombra de dúvida que as mulheres portuguesas o façam de forma segura e clinicamente assistida, do que num qualquer vão de escada às mãos de uma qualuqer curiosa, tudo isto prejuízo, não só da fundamental prevenção que é preciso realizar (como falei anteriormente), bem como do acompanhamento clínico prévio à IVG, sobretudo ao nível psicológico, que deve ser realizado de forma muito incisiva no intuito de demover a mulher de realizar tal acto.
Em suma, voto `SIM´, porque num cenário muito amargo (mas proporcionalmente muito real), não quero a mudança, para que tudo continue exactamente na mesma...
Abraço a todos.
A grande diferença entre a menina da foto e as que se tapam demais é que aquela parece que sua menos e cheira melhor ! E nisso, até Patrick Süskind viu motivos de inebriar o comum dos mortais e levá-lo ao .... pecado !
Daí ao aborto, é apenas a distância na contenção do arrebatamento animalesco !!!
Abaixo as burkas !
Gosto da forma como o tema é abordado neste blog. Estamos a dar uma lição de calma e profundidade invejável aos movimentos que defendem o "Sim" e o "Não". Se calhar percebemos mais destes assuntos candentes do que de karts.
Há muito que estou intimamente dividido sobra a questão, como muitos de vós. No anterior referendo obriguei-me a uma tomada de posição, por achar que seria uma covardia fugir à minha responsabilidade: se eu não for capaz de formar uma opinião, não posso exigir que a sociedade e o estado sejam.
A minha opção foi "Não", com base num ponto que discordo inteiramente na pergunta e que se sobrepôs ao resto: Se tenho dúvidas que a mulher possa tomar a sua opção sobre a vida que nasce, tenho a certeza que se a puder tomar, nunca poderá ser à revelia do Pai.
Assim, enquanto não reformulassem a questão, preparava-me para continuar a votar "Não".
Confesso que o post do Alexandre me faz pensar na questão de outra forma: A abstenção pode ser a melhor forma de repensar o tema, em vez de insistir na mesma pergunta retorcida. O problema é que se fizerem bem a pergunta e seu enquadramento, volto ao dilema anterior.
Daqui até dia 11 ainda vou meditar entre as 2 opções que agora se me apresentam.
Obrigado Alexandre pela alternativa.
Enviar um comentário
<< Home